quinta-feira, 28 de outubro de 2010

"´BEM-AVENTURADA DOS POBRES´ - Irmã Dulce será beatificada"

O anúncio foi feito pelo bispo Primaz do Brasil, D. Geraldo Majella, que afirmou que o papa Bento XVI assinará a beatificação antes do Natal; Salvador prepara grande festa
AGÊNCIA O GLOBO

Irmã Dulce começou a praticar a caridade aos 13 anos, quando recebia mendigos na casa de sua família em Salvador

Karla Feitosa, que conta sua própria história de milagre atribuído à Irmã Dulce, acredita que a canonização virá em breve

Centro Educacional Santo Antônio, uma das obras de Irmã Dulce, está entre as melhores escolas públicas do Brasil

Vaticano reconhece milagre da religiosa nordestina; após segundo milagre, ela poderá ser santificada

Salvador. A Congregação para a Causa dos Santos do Vaticano reconheceu, ontem, por meio de voto favorável e unânime do colégio de cardeais e bispos, a autenticidade de um milagre atribuído à Irmã Dulce. Esta é a última etapa do processo de beatificação da religiosa.

O anúncio foi feito pelo Arcebispo Primaz do Brasil, D. Geraldo Majella Agnelo, em coletiva realizada na sede das Obras Sociais Irmã Dulce em Salvador. De acordo com o cardeal, o papa Bento XVI assina o decreto oficializando a concessão do título de Beata ou Bem-aventurada à freira baiana antes do Natal.

Com o reconhecimento final do Papa, Irmã Dulce passará a se chamar "Bem-aventurada Dulce dos Pobres". A concessão do título de Beato ou Bem-aventurado é o reconhecimento de que a pessoa viveu as virtudes cristãs em "grau heróico".

Um dia após o decreto papal, o processo de canonização já pode ser iniciado. A cerimônia de beatificação do Anjo Bom do Brasil está programada para o primeiro semestre de 2011, no Parque de Exposições da capital baiana. Os seguidores de Dulce preparam uma festa para a beatificação. Segundo D. Geraldo, o evento deve contar com a presença do presidente da Congregação para a Causa dos Santos, o arcebispo italiano d. Angelo Amato.

Comprovação:
O milagre validado pelo Vaticano passou por três etapas de avaliação: uma reunião com peritos médicos (que deram o aval científico), com teólogos, e, finalmente, a aprovação final do colégio cardinalício, tendo sua autenticidade reconhecida de forma unânime em todos os estágios do processo.

Uma graça só é considerada milagre pelo Vaticano após atender a quatro pontos básicos: a instantaneidade, que assegura que a graça foi alcançada logo após o apelo; a perfeição, que garante o atendimento completo do pedido; a durabilidade e permanência do benefício e seu caráter preternatural (não explicado pela ciência).

O milagre atribuído a Dulce, morta em 1992, aos 77 anos, ocorreu em 2001, no interior baiano, após uma mulher sofrer uma hemorragia pós-parto e ser desenganada pelos médicos.

A família chamou um padre e fez orações dirigidas a Dulce. O sangramento foi estancado e a mulher, que não tem a identidade revelada pelo Vaticano, foi curada. O acontecimento passou a ser estudado pelo Vaticano no ano seguinte.

Em 2003, o evento foi validado juridicamente pela Igreja e foi analisado por médicos, por teólogos e pelo colegiado dos cardeais. Nas três, a confirmação do milagre foi unânime.

"Em um período de 18 horas, a paciente chegou a passar por três cirurgias, mas o sangramento não cessava. Contudo, sem nenhuma intervenção médica, a hemorragia subitamente parou e a paciente passou a ter uma impressionante recuperação", afirmou o médico Sandro Barral, um dos peritos que participou do processo de análise do milagre.

Conforme relatos da época, o fim do sangramento ocorreu no mesmo instante em que um grupo de orações pedia a intercessão de Irmã Dulce em favor da parturiente. "A corrente de orações foi proposta por um sacerdote, contemporâneo de Irmã Dulce, que chegou, inclusive, a enviar para a família dela um pedaço de tecido do hábito (relíquia) que pertenceu à religiosa", comenta o assessor de Memória e Cultura das Obras, Osvaldo Gouveia.

Ao ser chamado à casa da parturiente, o médico achou que estava indo assinar seu atestado de óbito, em virtude da gravidade da situação, mas ao chegar ao local encontrou a mãe já recuperada e com o bebê em seus braços. A identidade da paciente e o local do milagre só serão revelados um mês antes da cerimônia de beatificação.

Canonização

Fase diocesana:
Ocorre na diocese onde morreu o candidato. Comissão nomeada começa a reunir os testemunhos

Fase romana:
Os documentos seguem para o Vaticano, onde serão examinados pela Congregação das Causas dos Santos. Após esta etapa, é nomeado um relator

A Positio:
Com base nos documentos, que resumem a vida a vida e os testemunhos sobre as virtudes do candidato, a Congregação faz o seu julgamento sob os pontos de vista histórico e teológico. Com a positio aprovada, o candidato torna-se venerável

Beatificação:
Para ser reconhecido como beato, o venerável precisa de um milagre que satisfaça as condições de instantaneidade (ocorrido logo após o pedido), perfeição (atendido completamente), durabilidade (a cura permanente) e preternaturalidade (a ciência não explica).

Canonização
Ocorre com a confirmação de um segundo milagre. Então, o beato se torna um santo.

VOCAÇÃO:
´Anjo Bom´ dedicou a vida aos pobres

Salvador. Conhecida como o "Anjo Bom da Bahia", Irmã Dulce nasceu em Salvador, no dia 26 de maio de 1914, e recebeu o nome de Maria Rita de Souza Brito Lopes Pontes.

Aos 13 anos, ela começou a praticar a caridade ajudando os mendigos das ruas de Salvador. Ela recebia os necessitados na casa de sua família, que ficou conhecida na época como a "Portaria de São Francisco", devido ao grande número de pessoas carentes que se aglomeravam à porta.

Devota de Santo Antônio, a religiosa costumava rezar muito e pedir sinais da sua vocação religiosa. Ainda com 13 anos, ela foi recusada pelo Convento do Desterro por ser jovem demais e continuou a estudar.

Seis anos mais tarde, ingressou na Congregação das Irmãs Missionárias da Imaculada Conceição, em Sergipe. Após seis meses de noviciado, tomou o hábito de freira. No dia 15 de agosto de 1934, ela fez sua profissão de fé e voltou à Bahia.

Irmã Dulce dedicou a sua vida aos necessitados. Começou sua obra ocupando um barracão abandonado para abrigar mendigos e chegou a receber o papa João Paulo II quando ele esteve no Brasil, devido ao seu trabalho com idosos, doentes, pobres, crianças e jovens carentes.

Em 1990, a religiosa começou a apresentar problemas respiratórios sendo internada no Hospital Português e depois transferida à UTI do Hospital Aliança e finalmente ao Hospital Santo Antônio.

Durante a visita do papa Bento XVI ao Brasil em 2007, o então governador de São Paulo, José Serra, enviou uma carta pedindo a beatificação da religiosa brasileira.

A freira morreu no dia 13 de março de 1992, aos 77 anos. Em junho deste ano, o corpo de Irmã Dulce foi exposto ao público pela última vez antes de ser transferido para um túmulo lacrado na Capela das Relíquias, em Salvador. Exumado em maio, o corpo da religiosa estava mumificado e seu hábito (traje de freira), preservado.

SEGUIDORES:
Cearenses relatam histórias de milagres

A notícia da beatificação da Irmã Dulce foi recebida com satisfação também no Ceará, por voluntários da causa e do trabalho social que foi um dos legados que a religiosa baiana deixou. A filósofa Karla Feitosa, que participa de um grupo de oração ligado à memória de Irmã Dulce, diz que com este último passo dado pelo Vaticano, espera para breve a canonização.

"Ela foi uma pessoa que exerceu bem as três virtudes cristãs, que são a fé, a esperança e a caridade. Independente de religião, ela foi uma pessoa que só fez o bem", diz Karla Feitosa. A filósofa tem sua própria história de milagre atribuído à Irmã Dulce. Karla conta que em 2006 ficou cega do olho esquerdo, após ser atingida por uma bola de tênis. O problema originou um cisto e a conclusão era de que ela teria de colocar um olho de vidro. Mas isso acabou não sendo preciso. Uma cirurgia bem-sucedida, a qual ela atribui como um milagre de Irmã Dulce, conseguiu recuperar 85% de sua visão. "Entrei no centro cirúrgico com um véu que pertenceu à Irmã Dulce e o médico rezou antes de começar a cirurgia", conta.

O advogado e empresário Mauro Feitosa, embaixador das Obras Sociais de Irmã Dulce no Ceará, também relata a recuperação de seu filho, que aos 13 anos apresentou um quadro de tumor no cérebro. Em São Paulo, onde foi fazer a cirurgia, recebeu uma relíquia da religiosa baiana. "A cirurgia que era para durar 15 horas acabou durando três horas e meia. O tumor que era maligno se transformou em benigno", conta. O relato da cura foi enviado a Salvador, para compor o processo de beatificação. Em homenagem à trajetória de milagres da religiosa, Feitosa também foi um dos criadores do grupo de oração "Anjos de Irmã Dulce", no ano de 2003.

"O grande milagre foi a obra social que ela deixou. No coração já temos Irmã Dulce como santa. A beatificação é um momento de muita alegria. Será a primeira santa nascida no Brasil. E, melhor ainda, nascida no Nordeste", diz.

FILANTROPIA:
Instituição ajuda pessoas carentes

Salvador. Em 1959, a religiosa baiana fundou as Obras Sociais Irmã Dulce (Osid), que são uma instituição filantrópica, de fins não econômicos, de perfil operacional único no Brasil.

A instituição desenvolve em seus 13 núcleos ações nas áreas de Saúde, Assistência Social, Educação, Pesquisa Científica, Ensino Médico e Memória, incluindo em seu painel de serviços atividades que vão do atendimento básico à pesquisa de ponta. As Osid é reconhecida como uma entidade que congrega a excelência técnica e o pioneirismo em práticas de humanização no atendimento à população de baixa renda.

A organização tem sua estrutura física dividida entre o Complexo Roma, em Salvador, onde estão localizados os serviços de saúde e assistência social, e o Centro Educacional Santo Antônio, no município de Simões Filho, Região Metropolitana de Salvador. É constituída operacionalmente por núcleos que prestam assistência médica, social e educacional à população em geral.

A partir de 2005, a instituição passou a atuar também na gestão de centros de saúde do município de Salvador e hospitais construídos pelo governo do estado.

Em fevereiro de 2008, as Osid receberam em fevereiro de 2008 em Madri, Espanha, o Prêmio Rainha Sofia de Reabilitação e Integração 2007, um dos mais importantes do mundo na área social.

A organização também ganhou, em 2006, o Prêmio Gestão Qualidade Bahia (PGQB)na categoria Nível I. O PGQB reconhece as organizações que investem na excelência de gestão com o objetivo de atender às necessidades de suas partes interessadas e tem como referência os Critérios de Excelência do PNQ - o Prêmio Nacional da Qualidade.

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